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Brexit. Quando voltei para Londres no início do ano sabia que o referendo ia acontecer em Junho, mas a verdade é que nunca acreditei que fosse possível que o Reino Unido fosse realmente sair da União Europeia. Eu adoro a União Europeia, acho que não existe projecto mais ambicioso e rico do que a união de tantos países diferentes que juntos tentam construir uma sociedade livre, de paz e intercâmbio de culturas. Não duvido por um segundo que estamos melhor hoje do que estávamos há 30 anos atrás quando era cada um por si. Como é obvio, erros foram cometidos e nem sempre tudo correu pelo melhor, mas se pensarmos na quantidade de pessoas a falar línguas diferentes que se juntam numa sala e lutam por se entenderem para fazer algo melhor acho podemos apreciar o esforço magnânimo que tem sido feito. Mas o que me entristece mesmo muito é ver no que a campanha para este referendo transformou este país. Eu vivi em Londres antes e sempre adorei a sociedade multi cultural onde tudo é possível, onde as pessoas são vistas pelo valor que têm e não pelo sítio de onde são. Nesta cidade fiz amizades que tem muito valor para mim, conheci pessoas de Espanha, de Itália, França, Bolívia, Singapura, Índia, Chile, Malásia, China, África do Sul, Noruega e de tantos outros sítios e sempre me espantou perceber como podemos ter tanto em comum com pessoas que não partilham as mesmas referencias que eu. Este referendo dividiu o país ao meio e criou uma racha que dificilmente vai ser corrigida, deu voz e encorajou as pessoas que acham que tudo o que corre mal é por culta dos estrangeiros, seja os que estão cá,sejam os que estão em Bruxelas. Criou a ideia que todos se aproveitam do Reino Unido, que o país é controlado pelos vilões que roubam o dinheiro que devia ficar cá. Este referendo ajudou a que se propagassem mentiras e desinformação, e o mais triste é pensar que independentemente do resulta o trabalho dos partidos de extrema direita já tinha sido feito. Londres que eu conheci há uns anos atrás não era motivada pelo ódio contra estrangeiros, mas hoje há quem pense que o resultado de sair da União Europeia justifica que se possam tratar mal as pessoas de outros países que cá vivem. Antes nunca pensava que podia ser alvo de ódio das pessoas de cá, mas a verdade é que desde que passou o referendo que já tive 3 situações em que senti que estava a ser maltratada por ser estrangeira, nada de muito grave, mas o suficiente para não me sentir bem vinda aqui. Hoje em dia penso constantemente que tenho de ter cuidado e não foi para isto que eu vim viver para cá. Não foi para este país que vim viver.